quinta-feira, abril 17, 2008

Desafinando o coro dos contentes




Let's Play That
Torquato Neto

quando eu nasci
um anjo louco muito louco
veio ler a minha mão
não era um anjo barroco
era um anjo muito louco, torto
com asas de avião

eis que esse anjo me disse
apertando minha mão
com um sorriso entre dentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
let's play that

Eu adoro o poema acima. Gosto de imaginar um coro cheio de contentes cantando e no meio deles um desajeitado de voz fininha, desafinando alto. As vezes eu me sinto esse desajeitado, falando o que não devia, deixando explicito o que penso e sinto, discordando quando era pra simplesmente abaixar a cabeça e cantar contente, no ritmo. Mas que ritmo? Eu desafino bonito, não vejo a mínima graça no comum e sofro, as vezes, um certo isolamento por não pensar como a maioria. Eu sei que ninguém quer ser sozinho, mas é o preço que se paga por ser diferente. Talvez se eu fingisse ser mais feliz, disfarçando melhor as frustrações; talvez se eu omitisse as minhas trapalhadas, as atitudes que me envergonham e mostrasse só o lado bom, como faz quase todo mundo. E se ao invés de metralhar o que penso por aí, como sempre faço, eu resolvesse só sorrir, perdendo a espontaneidade e agindo como um robô. Mas um robô aceito...

Esse papo todo me lembrou um outro poema, dessa vez do Fernando Pessoa. Principalmente na parte que diz:


"Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida..."

Um comentário:

Alex Pinheiro disse...

vc foi adoravelmente honesta.gostei,sou parecido..tbm um anjo torto..